Uma pesquisa do Datafolha entrevistou 3.667 brasileiros, em 190 municípios, entre 13 a 15 de setembro para saber sobre o consumo de alimentos neste ano.

Entre os entrevistados, 67% relatam terem reduzido a carne bovina; refrigerantes e sucos foram 51%, e lacticínios, como leite, queijo e iogurte foram diminuídos entre 46% da população. Frango, porco e outros tipos de carnes caíram 39%. Nem mesmo o Exército brasileiro deixou de ser afetado pela oscilação no preço dos alimentos, para se ter ideia do impacto disso no cotidiano.

Os alimentos que apresentaram maior estabilidade são os clássicos do prato brasileiro. O arroz, com 41%, e, logo em seguida, o feijão, com 40% dos entrevistados que relataram não terem mudado o consumo.

Segundo estimativas da FGV, em abril de 2021, 27,7 milhões de brasileiros (12,98%) estavam abaixo da linha da pobreza, com renda de R$ 261 mensais (US$ 49). Em 2019, o número era de 23,1 milhões de pobres (10,97%).

Dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), de agosto deste ano, apontam que o custo médio da cesta básica subiu em 13 das 17 capitais analisadas. As mais caras estão em Porto Alegre (RS), com o valor de R$ 664,67, e em Florianópolis, ao custo de R$ 659.

A inflação dos alimentos foi mais severa especialmente com os mais pobres. A avaliação do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) – responsável por medir a inflação referente ao consumo das famílias, aponta que o custo de vida da classe de renda alta subiu 3% em 2020, enquanto a classe pobre sofreu com o dobro, 6%. A classe média registrou 4%.

Em 2021, o cenário se repete, castigando as pessoas com menos renda. A inflação para este grupo ficou acima de 9%; a classe média com 8%, e atrás as famílias com renda alta, entre 6 a 7%, diz o Ipea.

O IPCA geral fechou em 2020 com avanço de 4,52%, maior taxa desde 2016. A inflação dos alimentos, em especial, foi três vezes maior, com 14,1%.

O que explica a alta da inflação?

O cenário de alta da inflação está ligado às mudanças nos padrões de consumo associadas à pandemia, o timing e o montante alto da transferência pública de renda (auxílio emergencial), os desarranjos das cadeias produtivas, problemas climáticos, a elevação dos preços internacionais das commodities e, principalmente, a disparada do dólar, explica o coordenador científico do Cepea, Geraldo Barros.

Vitor Benites tem 21 anos e trabalha como web designer. Durante a pandemia, ele sentiu o seu poder de compra diminuir. Carnes, óleos e alimentos supérfluos foram os principais alimentos que cortou da lista na ida ao supermercado e algumas medidas foram tomadas para que os alimentos durem mais.

“Agora eu faço a feira a cada duas semanas, evito o desperdício de alimentos, fazendo receitas que aproveitam partes como cascas de vegetais. Compro em quantidades menores e troquei os refrigerantes por sucos, e acabo comendo fora bem menos”, ele conta.

Ligia Soares, 25, é estudante e mora em Curitiba com o namorado. Ela comprava muitas frutas, verduras, grãos variados e carne, mas devido a alta de preço isso se tornou mais escasso. Durante a pandemia os pais de Ligia, que enviavam dinheiro para custear sua estadia em outra cidade, ficaram desempregados, o dinheiro foi diminuindo e ela teve que recorrer ao auxílio emergencial.

Agora ela busca os sacolões de Curitiba, onde compra frutas e verduras por preços bem baixos e assim pode ter uma alimentação mais nutritiva e balanceada. O namorado de Ligia, que trabalha, acaba comprando itens como carne de aves e alimentos mais caros uma vez ao mês, o que fez com que diminuíssem o consumo de proteína animal.

O que explica a instabilidade do mercado?

A insegurança sobre o comportamento imprevisível das instituições – envolvendo os três poderes da República, e seus embates, tem aumentado o risco-país (medidor de instabilidade econômica) e afastado investidores internacionais, explica o coordenador científico do Cepea. Esse cenário explica, em parte, a forte valorização do dólar sobre o Real e a permanência no patamar elevado.

Em janeiro de 2020, a moeda norte-americana estava avaliada a R$ 4, e terminou o ano em R$ 5,18, acumulando alta de 29,33% no ano. Há quem diga que pode chegar a R$ 6 ainda neste ano.

“O Cepea calculou que o efeito do dólar na explicação do choque não esperado de preços dos alimentos no Brasil, foi, em 2020, cinco vezes maior do que o dos preços das commodities”, afirma o pesquisador Barros.

A valorização do dólar afeta toda a cadeia de produtos importados e exportados, além de funcionar como um balizador dos reajustes de preços na economia em momentos de incerteza, afirma Barros. Também entram nessa conta os preços dos combustíveis que afetam, por conseguinte, o frete de todos os bens.

Outro setor que onera fortemente o consumidor de baixa renda é o de transporte urbano, devido ao custo da energia que tem como fonte petróleo e derivados, muito influenciado pelo dólar.

No setor de produção de alimentos, a alta do dólar em geral favorece o segmento exportador, refletido nos dados da balança comercial das exportações do agronegócio em 2020. O faturamento somou US$ 101 bilhões, crescimento de 4% na comparação com o ano anterior, enquanto o volume embarcado subiu 10%, ambos recordes na série histórica do Cepea.

O Brasil teve uma safra de grãos no ciclo 20/21 estimada em 252,3 milhões de toneladas, de acordo com dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Apesar do volume impressionante, o país sofre com uma forte alta no preço dos alimentos.

O economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Marcelo Kfoury, afirma que a valorização no preço das commodities foi sentida mundialmente e que os preços no mercado interno não dependem somente da produção brasileira.

“Houve um grande aumento da demanda mundial por alimentos, o que fez com que os preços subissem muito. Além disso, a desvalorização da moeda fez com que os preços dos alimentos aumentassem ainda mais. Desde o início da pandemia, em fevereiro de 2020, os preços das commodities agropecuárias subiram 60%”, explica o professor.

A previsão para os próximos meses sobre os valores dos alimentos não é muito otimista, segundo Kfoury. Os preços no mercado atacadista de produtos agrícolas continuam crescendo e para os próximos meses a expectativa é que permaneçam a subir.

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